sábado, fevereiro 24, 2007

Estava triste, é só.

Estava a tentar fazer uma última revisão, para um exame que vou ter na segunda-feira, dia 26 de Fevereiro.
Estava a sentir mt só. E sem mt vontade de fazer essa tal revisão, decide ler uns poemas.
Que partilho com vocês; alguns desses mesmos poemas, os que eu mais gostei.
Aki vai.

Poemas varios:

Amor é fogo que arde sem se ver

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?


Luís de Camões

Verdes são os campos

Verdes são os campos,
De cor de limão:
Assim são os olhos
Do meu coração.

Campo, que te estendes
Com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,
De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.

Gados que pasceis
Com contentamento,
Vosso mantimento
Não no entendereis;
Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração.

Luís de Camões

Alma minha gentil, que te partiste

Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida, descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.

Luís de Camões


Variações sobre O POEMA POUCO ORIGINAL DO MEDO
de Alexandre O'Neill


Os ratos invadiram a cidade
povoaram as casas os ratos roeram
o coração das gentes.
Cada homem traz um rato na alma.
Na rua os ratos roeram a vida.
É proibido não ser rato.

Canto na toca. E sou um homem.
Os ratos não tiveram tempo de roer-me
os ratos não podem roer um homem
que grita não aos ratos.
Encho a toca de sol.
(Cá fora os ratos roeram o sol).
Encho a toca de luar.
(Cá fora os ratos roeram a lua).
Encho a toca de amor.
(Cá fora os ratos roeram o amor).

Na toca que já foi dos ratos cantam
os homens que não chiam. E cantando
a toca enche-se de sol.
(O pouco sol que os ratos não roeram).


Manuel Alegre

Olhando o mar, sonho sem ter de quê

Olhando o mar, sonho sem ter de quê.
Nada no mar, salvo o ser mar, se vê.
Mas de se nada ver quanto a alma sonha!
De que me servem a verdade e a fé?

Ver claro! Quantos, que fatais erramos,
Em ruas ou em estradas ou sob ramos,
Temos esta certeza e sempre e em tudo
Sonhamos e sonhamos e sonhamos.

As árvores longínquas da floresta
Parecem, por longínquas, 'star em festa.
Quanto acontece porque se não vê!
Mas do que há pouco ou não há o mesmo resta.

Se tive amores? Já não sei se os tive.
Quem ontem fui já hoje em mim não vive.
Bebe, que tudo é líquido e embriaga,
E a vida morre enquanto o ser revive.

Colhes rosas? Que colhes, se hão-de ser
Motivos coloridos de morrer?
Mas colhe rosas. Porque não colhê-las
Se te agrada e tudo é deixar de o haver?


Fernando Pessoa

BOLAS DE FOGO

Há montanhas que cospem fogo.
Chamam-se vulcões,
mas são montanhas.
Esta montanha, todos os dias,
cospe uma bola de fogo.
A bola sobe, sobe devagarinho...
Ela é feita só de fogo e é tão leve...
E quando não pode subir mais
começa a descer...
também devagarinho...
Até que encontra o mar no seu caminho.
E o mar engole a bola de fogo.
Então a montanha, zangada com o mar,
cospe outra bola de fogo!
As coisas que vemos todos os dias
todos os dias são outras coisas.


Fonte: http://sweet.ua.pt/~f711/ideias.htm

Canções:

+ perto do céu

Enquanto eu te escrevo,
Sarajevo morre lenta
uma morte amordaçada
no silêncio dos tiros
e na paz da granada.
A noite acoita o metralhar
será homem ou fera
este triste uivar?
Posso ver as avenidas,
coloridas, presentes,
hoje sombras despidas
do passado distante.
A vez do vizinho
que hoje foi a enterrar,
sózinho, claro, que morrer é ficar.
Os amantes ali estão
abraçados no asfalto
onde as balas lá do alto
os apanharam à traição,
no coração, que é o sítio ideal
para quem mata a paixão,
que amar é fatal.

(refrão)

+ perto do céu
anjo d'alma azul
+ perto do céu
+ longe que o sul.

Calor, já não há,
só se for o da mortalha
que é o lençol que me agasalha
e a cama onde me deito
e me enrolo sobre o peito,
recordando o céu azul,
e quer a norte quer a sul
a liberdade de fugir.
Ficar a resistir,
morrer, nem pensar,
que a coragem de aqui estar,
como ontem em Guernica,
é a vontade de quem fica.
Vazia a dispensa
é pior a indiferença.
Auschwitz ou Buchenwald
que afinal foram debalde,
porque as câmaras de gás
não ficaram para trás
estão aqui à minha frente.
Eu só quero estar presente
de novo em Nuremberga,
porque um povo não se verga.

(refrão)

Por isso aqui estou
com arma sem munição,
carne para canhão
para contar toda a verdade...
... e liberdade.
E no futuro, nem sequer se vão lembrar
que tudo dói, mesmo Tolstoi
lido à luz da curta vela.
Sarajevo donzela
tantas vezes violada,
sempre só, abandonada.
Tudo o que tenho
é o empenho de quem sonha.
O silêncio é vergonha,
arma mortal, punhal
que mata e maltrata
escondido, sem ruído,
tantas vezes repetido,
e penetra no meu corpo,
que deixa morto
pelas costas...
sem resposta.

Agora é de vez.
Faz frio no inferno deste Inverno.
Cada bomba é uma sombra de indiferença.
Crença que tem que mudar.
Há que gritar e mostrar
ao mundo os mortos
que o mundo ignora
e demora a perceber.
Uso a caneta
que é a minha baioneta,
país eterno
que deixo no caderno
tenho medo que me esqueças
e me peças para calar a voz,
mas não o faças,
porque ontem foram outros
e hoje nós.

(refrão)


Pedro Abrunhosa, in Viagens

Viagens

Já vai alta a noite, vejo o negro do céu,
deitado na areia, o teu corpo e o meu.
Viajo com as mãos por entre as montanhas e os rios,
e sinto nos meus lábios os teus doces e frios.

E voas sobre o mar, com as asas que eu te dou,
e dizes-me a cantar: "É assim que eu sou".
Olhar para ti e ver o que eu vejo,
olhar-te nos olhos com olhares de desejo.
Olhar para ti e ver o que eu vejo,
olhar-te nos olhos com olhares de desejo.
Eu não tenho nada mais p'ra te dar,
esta vida sao dois dias,
e um é para acordar,
das historias de encantar,
das historias de encantar.

Viagens que se perdem no tempo,
viagens sem princípio nem fim,
beijos entregues ao vento,
e amor em mares de cetim.
Gestos que riscam o ar,
e olhares que trazem solidão,
pedras e praias e o céu a bailar,
e os corpos que fogem do chão.

Pedro Abrunhosa, in Viagens

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