quinta-feira, março 27, 2008

Por vezes os momentos; não se vêem, mas sentem-se.

Aki fica uns sonetos.



William Dyce, Omnia Vanitas, quadro acima

EM BUSCA DO AMOR - Florbela Espanca

O meu Destino disse-me a chorar:
"Pela estrada da Vida vai andando,
E, aos que vires passar, interrogando
Acerca do Amor, que hás-de encontrar."
Fui pela estrada a rir e a cantar,
As contas de meu sonho desfiando...
E noite e dia, à chuva e ao luar,
Fui sempre caminhando e perguntando...

Mesmo a um velho eu perguntei: "Velhinho,
Viste o Amor acaso em teu caminho?"
E o velho estremeceu... olhou... e riu...

Agora pela estrada, já cansados,
Voltam todos p'ra trás desanimados...
E eu paro a murmurar: "Ninguém o viu!..."
in «Livro de Mágoas», 1919

Jonh Grimshaw, Elaine , quadro acima

OS GARÇOS OLHOS, EM QUE AMOR BRINCAVA - Bocage

Os garços olhos, em que Amor brincava,
Os rubros lábios, em que Amor se ria,
As longas tranças, de que Amor brilhava:

As melindrosas mãos, que Amor beijava,
Os níveos braços, Ermânia, à terra fria
Pelo fatal poder, que a tudo agrava:

Seguiu-te Amor ao tácito jazigo
Entre as irmãs, cobertas de amargura,
E o que faço (ai de mim !) como as não sigo?

Que há no Mundo que ver, se a Formusura,
Se Amor, se as Graças, se o Prazer contigo
Jazem no eterno horror da Sepultura?
de «366 poemas que falam de amor»

Dante Gabriel Rossetti, Proserpine , quadro acima


ALMA PERDIDA- Florbela Espanca

Toda esta noite o rouxinol chorou,
Gemeu, rezou, gritou perdidamente!
Alma de rouxinol, alma da gente,
Tu és, talvez, alguém que se finou!
Tu és, talvez, um sonho que passou,
Que se fundiu na Dor, suavemente...
Talvez sejas a alma, a alma doente
Dalguém que quis amar e nunca amou!
Toda a noite choraste... e eu chorei
Talvez porque, ao ouvir-te, adivinhei
Que ninguém é mais triste do que nós!
Contaste tanta coisa à noite calma,
Que eu pensei que tu eras a minh'alma
Que chorasse perdida em tua voz!...
in «Livro de Mágoas»
Jonh Waterhouse, Lamia, quadro acima

Ó TRANÇAS DE QUE AMOR PRISÕES ME TECE - Bocage

Ó tranças de que Amor prisões me tece,
Ó mãos de neve, que regeis meu fado!
Ó tesouro! Ó mistério! Ó par sagrado,
Onde o menino alígero adormece!

Ó ledos olhos, cuja luz parece
Tênue raio de sol! Ó gesto amado,
De rosas e açucenas semeado,
Por quem morrera esta alma, se pudesse!

Ó lábios, cujo riso a paz me tira,
E por cujos dulcíssimos favores
Talvez o próprio Júpiter suspira!

Ó perfeições! Ó dons encantadores!
De quem sois? Sois de Vênus? — É mentira;
Sois de Marília, sois dos meus amores.
in, «SONETOS»

Aquele abraço e boas pedaladas, alexjudoka_gmr.

Sem comentários: